Tide of Time - Vladimir Kush |
Como se amplia a angústia quando o pensamento teima em andar
de um lado para o outro na ilusória linha do tempo!
Cada vez que o passado bate à porta e o deixamos entrar,
fenece a alegria, medra o pesar. Se ao sofrimento de outrora estendermos a
passadeira vermelha e a cada segundo lhe reiterarmos a admiração pelo
sacrifício e pela dor, a felicidade, inteirando-se, foge a sete pés para lugar
futuro, incerto e distante. Remexer o sótão das recordações pode, porém,
constituir acto de sensatez se, ao executar dita actividade, tivermos,
previamente, morrido. Só nesse estado se garante imunidade ao contágio e se
poderão colher, nos rincões da memória, os intemporais fragmentos úteis à
construção da vida.
Saltar para o futuro revela-se tão perigoso quanto o
mergulho nas névoas pardacentas do passado. Pela sua própria natureza, o terreno
gasoso do futuro nada sustém senão o desejo e a vã esperança. Construir
castelos no ar ajuda o tempo a passar, mas não o imbui de qualquer realidade. Trama
feita de fios de nada e urdidura de fios de coisa nenhuma são tela ambígua e
instável. São o tecido do futuro em que o desejo e a esperança parecem agigantar-se
e onde a felicidade, eterno objectivo do ser, se mantém distanciada, longínqua
e inalcançável, em indistinto horizonte.
Passado e futuro. Duas quase inexistências sobrevalorizadas.
E o presente, o momento de todas as coisas, do que já existe e do que há-de vir
a ser, posto de lado. A única realidade, o agora, postergada.
No presente, já não ouvimos o vento murmulhar por entre as
cores da natureza. Já nem sequer as tormentas feitas de ruidosos dilúvios e
cavos estrondos, quanto mais o som imperceptível do bater das asas de uma
borboleta ou o silencioso flutuar das nuvens altas e ronceiras. Já não ouvimos
o bater do coração, nem o pulsar da alegria simples, aquela que chega só porque
o sol brilha e o amor transborda sabe-se lá de onde. Já não ouvimos os
sorrisos, nem nos pomos à escuta de prantos escondidos. Já não gargalhamos à
chuva ou descalços na poça morna de água lamacenta.
No presente, já não ouvimos nada nem ninguém. Nem vemos, nem
sentimos. No presente, só estamos presentes no passado e no futuro. Que é
exactamente o mesmo que não estar, não ser, não existir. Fechámos os sentidos,
bloqueámos os sentimentos, afastámo-nos do manancial inesgotável do todo-em-tudo-aqui-e-agora.
Como haveremos, então, de alguma vez compreender profundamente a vida, se a cristalizamos no presente, apenas para reencontrar reflexos dela num passado morto, ou projectar desejos dela num futuro inexistente?
Olá "Isabelinha",
ResponderEliminardeixo-te esta música em tom de presente e que tem muito a ver com tudo isto que nos cerca, o natural e o fabricado:
http://www.youtube.com/watch?v=sXmWAOIWg3w&feature=youtu.be
Enquanto o tempo
Acelera e pede pressa
Eu me recuso faço hora
Vou na valsa
A vida é tão rara...
Enquanto todo mundo
Espera a cura do mal
E a loucura finge
Que isso tudo é normal
Eu finjo ter paciência...
Será que é tempo
Que lhe falta para perceber?
Será que temos esse tempo
Para perder?
Partes da música
grata pelo que me dás a ler
Minha querida aNatureza, é por haver pessoas como tu que não se extingue a minha esperança de um futuro melhor!
ResponderEliminarMuito obrigada por me leres!
Beijinhos!