quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Aquilo

O frio começa a chegar. Devagar, disfarçado pelo sol que ainda aquece, vai entrando sorrateiro e ocupando o seu lugar devido. Sente-se já uma certa nostalgia, uma certa saudade dos dias quentes de Verão que sempre parecem plenos, infindáveis, brilhantes, cheios de vida.
Lembrei-me de um Verão. Não sei qual porque o tempo não importa. Olhava, distraída, para um campo de milho. O milho verde, pujante, de um verde-escuro potente e vigoroso, ondulava de quando em quando ao sabor de uma brisa suave e quente. O céu, algo enevoado e tingido de uma cor indefinida, com matizes de um laranja-pálido que o sol semi-escondido lhe emprestava, parecia delinear o contraste perfeito entre a terra e o inefável…
Foi nesse preciso momento, em que desnudada de qualquer desejo e em que nenhum pensamento volitivo me assaltava, que toda esta paisagem se me apresentou ao olhar de uma forma diferente, nova, desconhecida: havia naquele campo de visão uma vida pulsante, uma dimensão diferente, palpitante, de uma realidade inequívoca, estrondosamente arrebatadora! O silêncio era de tal modo inebriante que qualquer palavra proferida naquele momento não teria tido sentido algum! E nas cores que eu via, no ar que respirava, aquilo estava ali, esplendorosamente pleno, fundamentalmente vivo e possante, absolutamente indefinível! Enchi o meu ser com aquilo e transbordei de algo colossalmente superior à felicidade, infinitas vezes maior que a alegria; nesse instante redefini-me e então já não era eu porque eu era aquilo!

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