J. Rentes de Carvalho |
Um dia descobri J. Rentes de Carvalho e desde aí sou leitora assídua do seu blogue Tempo Contado. Não deixo de ler nenhum post seu. E porquê? Porque J. Rentes de Carvalho possui aquela característica inquisitiva e crítica, aquele olhar incisivo e perscrutante e aquele espírito irrequieto e lutador, que caracterizam a pessoa que vive inteligentemente consciente de si, dos outros e do mundo que a rodeia. Rentes de Carvalho mostra tudo isso através da sua escrita rica e elegante, ora profundamente séria, ora orlada de humor. E por vezes até mistura o sério com o divertido, imprimindo desse modo uma força ainda mais poderosa ao que escreve.
Ora, no mês passado, decidiu J. Rentes de Carvalho fazer um concurso a que chamou Duas Perguntas. Ciente das minhas limitações e da minha falta de conhecimentos, decidi, ainda assim, concorrer. Assim fiz. E fi-lo secretamente acalentando o impossível desejo de ver respondidas por Rentes de Carvalho, a quem tanto admiro, as minhas perguntas.
E não é que ganhei!? Mas mais, muito mais do que o prémio, que obviamente também agradeço muito, ganhei as respostas de Rentes de Carvalho às minhas perguntas. E essas respostas vieram consolidar, de forma inequívoca, o que eu dele já antes pensava e lho fizera saber: “…a sua escrita, prezado Rentes de Carvalho, essa é elegante, pejada de conteúdo, sabiamente fundamentada e enriquecida, não com uma linguagem pedante e pesada mas com, creio eu, a linguagem que advém de todo um percurso de vida norteado por uma sensatez e uma acutilância que a grande maioria dos seres infelizmente não possui.”
Eis as minhas perguntas e as respostas de Rentes de Carvalho:
IG: Viajado como é, pelo mundo e pela vida, e se a determinada altura lhe desse por fazer um balanço introspectivo, gostaria que me dissesse, à luz desse balanço, se, para si, são as circunstâncias que fazem o homem ou, antes pelo contrário, o homem forja e molda as suas próprias circunstâncias?
JRC: Certezas não tenho, mas se fosse possível forjar e moldar as próprias circunstâncias, creio que a minha vida teria sido bem diferente, sem aventura, com menos sobressaltos, moderada nos resultados. Por outro lado, isso implicaria também a perda de momentos de muita adrenalina, de sentir extrema alegria, alguns êxtases, viver revelações surpreendentes, ter motivos para admiração e paixão. Posso dar-me a ideia de, uma vez ou outra, ter sido o timoneiro da barca, mas a força da corrente sempre pôde mais e levou a melhor sobre a minha perícia ao leme.
IG: Como leitora diária e atenta do seu blogue infiro que são muitas as características, digamos, menos nobres do ser humano que lhe causam sentida e sincera tristeza. A minha pergunta é, por oposição à minha afirmação, que resultados, que efeitos, da sua escrita, lhe causaram e continuam a causar-lhe uma profunda e genuína alegria?
JRC: Uma das desagradáveis características da alegria, mesmo profunda e genuína, é a velocidade com que perde impacto e se vai esvaindo da memória. Tivesse ela a força e a permanência da tristeza. Mas eu seria desagradecido e hipócrita se quisesse esconder ou diminuir as alegrias que a escrita me tem dado. Conto por alto: ver impresso o meu primeiro romance; os primeiros artigos de jornalismo; o impacto de Com os Holandeses no público holandês; as excelentes críticas aos meus livros na Holanda, na Bélgica, na Alemanha, no Le Monde e no International Herald Tribune; o êxito de Portugal, um guia para amigos; a recente edição da minha obra em Portugal.
São de facto muitas, grandes e pequenas, as alegrias que me têm vindo da escrita, mas entre as mais íntimas conto os testemunhos dos leitores, quando me dizem como, e por que motivo, os tocou um ou outro livro meu.