sexta-feira, 6 de setembro de 2013

Incomunicabilidades



Flight of the Sun - Vladimir Kush

Todos falamos português, mas parece, a maior parte das vezes, que não nos expressamos na mesma língua. Ainda que o resultado sejam sempre palavras, eu falo a partir da alma, do coração, do que sai tanto das profundezas do meu ser como das alturas do universo. É por isso que não me entendem. Eles não descem nem sobem. Não sentem vontade de ir mais além…

Falo-lhes da vida, que de tão sagrada deveria ser intocável, e eles falam-me de vingança, de impor justiça, de matar em nome da liberdade. Pena que não saibam que vingança é ódio em banho-maria, que a justiça não se impõe, pratica-se individualmente, que a morte só é aceitável se não acontecer às mãos de ninguém, e que liberdade é o que se encontra quando a vingança, o ódio, a imposição e a morte infligida forem meras cinzas desvanecidas e olvidadas.

Falo-lhes da felicidade e da alegria que me inundam, que de tão intensas e puras quase me elevam ao êxtase. E eles perguntam-me “Estás feliz porquê?”. Não entendem que não é preciso haver uma razão. Ou melhor, que não havendo nenhuma, há todas as razões e mais alguma!

Ah, se se atrevessem a descer às próprias profundezas, ou a subir tão alto que quase se perdessem no infinito, se ousassem passar para lá da fronteira que lhes foi estabelecida, ou que eles próprios criaram, nem português precisariam de saber falar. Em silêncio, bastaria um brilho no olhar, um mudo assentimento, e então saberiam do que falo…

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